"Ser Corinthiano é descobrir que todo ano a gente vai sofrer." - Gilberto Gil
30.12.03
intervalo - Por um defeito de comunicação entre o enetation e o meu cérebro, somente hoje que eu vi uma série de comentários feitos. Com um baita atraso, respondi a todos eles. Desculpas a Stuart, Quadrado, Elis, etc. Vamos para o jogo, então.
1995 - Campeonato Paulista - o ano que não acabava.
Nenhum corinthiano aguentava cantar mais "É Campeão". Dizia-se que a Prefeitura iria mudar o nome da Avenida Paulista para Avenida Corinthians. Só, que, ó enfado, outra final, desta vez o Campeonato Paulista.
Depois de ter eliminado a Portuguesa nos minutos finais do jogo, era a vez do Palmeiras. Estes caras já estavam atravessados na garganta, afinal, perdemos a final do Paulista de 93 e o Brasileiro de 94 para o time da Parmalat. Não aguentava mais eles. Perder de novo, não iria dar.
E não deu, mesmo. Como os estádios na cidade de São Paulo estavam indisponíveis, a final foi em Ribeirão Preto. No primeiro jogo, um empate. No segundo, o Palmeiras marca, logo no começo. Na mesma hora, eu senti um, hum, medinho. 93 e 94, de novo não.
Este jogo, eu vi na casa do Davi, junto com uns parentes dele e, principalmente, um primo palmeirense, que estava se sentindo a última gordura de picanha do churrasco. Mas uma falta na entrada da área, me fez pressentir o gol. Eu me levantei, me posicionei atrás do sofá, para não chutar a banqueta do piano que estava na nossa frente e lá foi o Marcelinho para a cobrança.
A bola foi justamente onde estava o Muller, do lado do goleiro. Um atrapalhou o outro e gol!! O gol!!! Santo Marcelinho!! Dali em diante, a confiança voltou e a prorrogação só serviu para o Elivélton marcar outro gol e mostrar o óbvio: naquele ano, o Corinthians tinha o melhor time do Brasil.
O ano de 95 tinha começado bem. Logo em Janeiro, veio a Taça São Paulo de futebol junior. Depois, no Carnaval, a Gaviões também foi campeã (veja bem, eu tenho algumas diferenças com a Gaviôes, mas o fato é pra se registrar).
Na Copa do Brasil, depois de ter eliminado o Vasco com uma bela goleada no Pacaembu, foi a vez do Grêmio ("time copeiro", "futebol pragmático", e outros blás blás blás que o lugar comum e a falta de criatividade da nossa imprensa esportiva gosta de nos impor). Ah, eles tinham o Felipão como técnico e aquele monte de botinudo que os gaúchos costumam chamar de jogadores de futebol.
Mas quem jogava futebol mesmo era Marcelinho Carioca, Viola e cia. Vitória em São Paulo e uma outra vitória, indiscutível, em Porto Alegre. 1 a 0, gol de Marcelinho, de cabeça, pra suprema ironia. Paulo Nunes, pra variar, bateu e foi expulso, em uma atitude tipicamente gremista loser.
Agora, me diz uma coisa: quem vence a Copa do Brasil o que é? Campeão brasileiro, oras. Ahá, uhú, o Brasil é nosso.
1994 - Campeonato Brasileiro - Corinthians e Flamengo
Casagrande tinha passado uma longa temporada na Europa, tendo passado por Portugal e Itália. Depois deste tempo, estava de volta ao Brasil, mas, que droga, foi jogar no Flamengo.
Tudo bem, tudo bom, até o dia em que os dois times se enfrentaram, em São Paulo. Foi o nome mais aplaudido pela torcida corinthiana. A cada vez que tocava na bola, a torcida cantava: "Doutor, eu não me engano, o Casão é corinthiano" ou "Volta, Casão, seu lugar é no Timão".
O resultado do jogo pouco importa (acho que o Corinthians ganhou). O que realmente importa é que, meses depois, o Casagrande voltava ao Corinthians.
Um dia, algumas coisas têm que acontecer mesmo. O Palmeiras estava há 16 anos na fila e uma hora, eles iriam ganhar algum título. Só não precisava ser logo em cima do Corinthians.
Um pouco antes da final, teve um jogo entre as duas equipes e ganhamos de 3 a 0, mole, mole. Bom, chegou a final e na primeira partida, Neto cobra a falta e Viola completa. O Viola saiu comemorando imitando um porco. Foi engraçado, é claro, mas esta comemoração foi determinante para o resultado final do campeonato. O jogo terminou 1 a 0 para o Corinthians
Entre uma partida e outra, o técnico do Palmeiras mostrou vídeos e vídeos da comemoração do Viola para os jogadores. Os caras entraram em campo com sangue nos olhos. Os caras fizeram um, dois, três, quatro gols, enfim (este último foi na prorrogação).
O Palmeiras saiu da fila. Foi uma das maiores dores de cabeça que já tinha tido, até então.
1990 – Campeonato Brasileiro – Ahá, uhú, o Brasil é nosso
O Corinthians tinha Neto. Jogador problemático, com excesso de peso, falastrão e excesso de talento no quesito “futebol”. Naquele ano, o Corinthians não precisava de muito mais. Ou precisava de muito pouco além disto.
Por algum mistério do futebol, nos classificamos para a fase final do campeonato em oitavo lugar. O primeiro adversário seria o Atlético Mineiro. No primeiro jogo, em São Paulo, gol do Atlético. Neto empata, de falta. Mais um tempo, a virada. No jogo de volta, em Belo Horizonte, muito sufoco, muita pressão e um empate na raça. O adversário seguinte, seria o Bahia. Foi um replay do que rolou com o Galo. Ganhamos em São Paulo, de virada (Neto, de novo?) e outro empate amarrado em Salvador.
Finalmente, estávamos na final, com dois jogos em casa, ou melhor no Morumbi, contra o velho São Paulo, que jogava com a vantagem de dois resultados iguais. Pouco adiantou esta vantagem. No primeiro jogo, uma falta, e lá estava Neto para a cobrança. Ele mandou a bola no meio da confusão e Wilson Mano (logo quem) meteu pra dentro.
O segundo jogo, bem o segundo jogo merece uma explicação. Eu não vi esta partida. Eu, hãn, bem, me desculpem aí, corintianada, eu estava num motel e FALTOU LUZ bem na hora do jogo. A energia elétrica voltou justamente na hora em que o jogo havia terminado. Mas o fato é que metemos outro 1 a 0 nos caras e ficamos com o título.
Não havia dúvidas, em 1990, Neto, ops, o Corinthians era o melhor time do Brasil
Corria o ano de 1988, e mais uma vez, o Corinthians não fazia uma campanha inesquecível. O campeonato paulista andava modorrento até que teve um Corinthians x São Paulo. Carlos, o goleiro azarado, era o titular do Timão. Não me lembro dele ter conquistado título algum, fosse na Ponte, ou na Seleção (Copa de 86, lembra?). O fato é que naquele jogo, ele estava machucado e não participou. Foi a estréia de um garoto de 20 anos, cheio de marra, Ronaldo. Além de marra, ele tinha estrela. Pegou um pênalti, logo na estréia e logo em um clássico. O Corinthians ganhou.
A partir dali, ele assumiu a condição de titular e o time chegou à final, contra o Guarani. O time deles era bom, tinha Neto, Evair, entre outros. O Corinthians tinha Wilson Mano, só para começar.
Na primeira partida, no Morumbi, empate, 1 a 1. O Guarani começou ganhando, com gol de bicicleta do Neto. O Corinthians empatou com Edson, naquelas bolas que batem em todo mundo e entra. Coisa típica de Corinthians.
Para o segundo jogo, em Campinas, todos davam como certo que a taça ficaria por lá mesmo. O Milton Neves chegou a dizer que rasgaria o diploma de jornalismo dele se o Guarani perdesse o título. Outra coisa que dava mais certeza para gente assim era o fato que o Edmar, centroavante titular, estava do outro lado do mundo, na Coréia do Sul, disputando as Olimpíadas. E seu substituto seria um outro garoto, um neguinho mirrado (na época). Viola. Vagner Bacharel, na época zagueiro do Guarani, dizia que o título tava no papo, e que com ele “a viola vai desafinar”.
Pois não foi isto que aconteceu. No dia 31 de julho (dia do meu aniversário), logo no começo da prorrogação, o Wilson Mano chuta de fora da área. Completamente torto, sem direção. Ou melhor, na direção do pé de Viola, que põe pro gol. O moleque tinha tanta certeza que iria fazer o gol que tinha entrado em campo com duas camisetas, uma por cima da outra. Assim, na comemoração, ele pôde tirar uma para atacar para a torcida.
Mais uma vez, o Corinthians foi campeão. E eu estou esperando até hoje Milton Neves rasgar seu diploma de jornalismo.
A Copa de 86 não foi a copa dos sonhos de ninguém. Naquela época, estava no terceiro colegial, mais preocupado em terminar o segundo grau e tocar com o pessoal. O Corinthians não tava lá grande coisa, tanto que não me lembro de nada de excepcional para falar neste post.
Voltando à Copa, então. Normalmente, o pessoal do colégio se reunia na casa de alguém para ver o jogo. Foram assim nos três primeiros jogos, sendo que em um deles, abandonamos a tevê para irmos ensaiar (era junho e o pessoal da nossa classe tinha montado uma barraca na festa junina e juntamos um pessoal pra tocar lá), que tava valendo mais a pena do que ver aquele time, hmm, desanimado. Teve a partida contra a Polônia, que tinha resolvido assistir sozinho. E teve a partida contra a França.
Naquele dia, por não estar me importando tanto com a Seleção e, principalmente, pra fazer pirraça com o restante do pessoal, decidi torcer para a França. Cheguei assobiando A Marselhesa e falando que a França iria ganhar. Afinal de contas, tinha Platini...
O Brasil marcou o primeiro gol e fui devidamente zoado pela galera. Quando a França empatou, silêncio na sala. Todos olhando para mim. Resolvi dizer que iria torcer pelo Brasil.
Eu até que me esforcei e disfarcei. Na prorrogação, quando o Zico perdeu o pênalti, todos olharam para mim, de novo. Quando o jogo foi para a disputa de pênaltis, resolveram me trancar no banheiro. Só que eu queria ver de qualquer jeito o final do jogo (que até estava bem legal, é fato). Forcei a porta, arrebentei a maçaneta, cortei o dedo (tenho a cicatriz até hoje).
Finalmente, saí do banheiro e ainda as cobranças ainda não haviam começado. Naquela casa, nós havíamos posto a tevê na garagem, de modo que o Babinha estava escondido debaixo do carro, para não ver os pênaltis. Todos estavam nervosos. Nós e os jogadores, talvez.
Sócrates errou. Platini errou. Júlio César errou. E teve aquele pênalti em que o Carlos foi para o lado certo e a bola bateu na trave, nas costas dele e entrou no gol. Se o goleiro tivesse ido para o lado errado, não teria sido gol. O fato é que o Brasil perdeu 3 pênaltis (1 na prorrogação e outros 2 depois). Assim, não dá pra ganhar nem a Copa Kaiser.
Depois do jogo, uma menina disse: "Acho que este lance de não torcer para o Brasil é falta de patriotismo", olhando para mim. Hohoho, pensei.
À noite, na festa junina, fomos tocar. Por alguma razão que eu desconheço, não estava no teclado e estava cantando. Uma das músicas era "Inútil", do Ultraje a Rigor. Embalado por umas batidas de côco, de amendoim, de maracujá, de qualquer coisa, mandei o verso "a gente joga bola e não consegue ganhar" umas 15 vezes na sequência. Fui além, inclusive - trocava o "a gente somos" do refrão pelos nomes dos jogadores que haviam perdido os pênaltis. Foi maldade eu sei, mas eles não precisam saber disto, certo?
O Brasil era um lugar esquisito. Vivia-se o fim do perÃodo militar, a anistia já tinha vindo, mas falar em democracia era algo, no mÃnimo, complicado, em muitos casos.
De repente, surge o Corinthians, com Sócrates, Vladimir, Casagrande, Zenon, Biro-Biro, Juninho e tantos outros, falando em DEMOCRACIA. Todas as decisões internas eram tomadas pelo grupo de jogadores, em votação. Ganhava-se aqui, perdia-se ali.
De repente, a esquerda brasileira passou a ver um grupo de jogadores politizados, pensantes e falantes. De repente, a popularidade destes jogadores foi além dos estádios de futebol - ia-se em show de Rock, lá estavam eles no palco. Participações em novelas, filmes, entrevistas. A Democracia Corinthiana criou ícones pop. E o melhor, com o time ganhando.
Em paralelo, existia o movimento Diretas Já!, onde as pessoas se mobilizavam para, pela primeira vez em tantos anos, votar para presidente. Sócrates e outros jogadores se engajaram na campanha. Ao vestir joelheiras, tornozeleiras ou faixas amarelas, estes jogadores transformaram uma partida de futebol em ato político. Com os militares só olhando.
Mas, os conchavos políticos foram sendo armados e sentia-se que o movimento nâo teria sucesso. Por outro lado, o Corinthians já nâo estava bem. Havia perdido o Paulista para o Santos e eliminado pelo Fluminense (do Parreira) nas semifinais do Brasileiro. A própria Democracia Corinthiana havia perdido seu gás e existiam propostas de fora para a contrataçãoo de Sócrates.
Um dos últimos comícios da Direta Já!, Sócrates discursou: "Eu quero votar para presidente. Se tivermos Diretas Já! eu não saio do Brasil!" Para bom entendedor, meia palavra basta. Ele já estava fora do Corinthians.
Este foi um dos jogos que mais me marcaram. Primeiro, porque tinha certeza que o Brasil seria campeão do mundo e que o Sócrates ergueria a taça. Segundo, porque simplesmente eu não consegui ver o jogo naquele dia.
Explico: o nervosismo era tanto, que me deitei no sofá da sala e cobri a cabeça com o cobertor, só escutando a narração do jogo. Quando acabou, chorei e muito. Depois daquele dia, nunca mais torci de verdade pela seleção brasileira. Só para o Corinthians.
O detalhe é que, anos depois, revi a partida e percebi o quanto ela mudou o futebol no Brasil e pelas razões erradas.
Todo mundo ainda diz que o time perdeu porque só sabia atacar. O Brasil dependia de um empate, mas ficou a maior parte do tempo em desvantagem. Oras, a única coisa que poderia ser feita era justamente buscar o gol.
Logo após o gol de empate, a primeira coisa que Telê Santana fez foi tirar um atacante (Eder, se não me engano) e colocar o Paulo Isidoro, justamente para segurar a bola. Finalmente, levou o terceiro gol, que surgiu em uma jogada de escanteio. Normalmente, times recuados tendem a serem mais atacados e cederem escanteios ao adversário. Em tese, se tivesse "recuado" como todos queriam, o Brasil levaria o gol de qualquer jeito.
O problema é que as pessoas não enxergam e nem admitem o óbvio - a Itália jogou muito naquele dia e mereceu ganhar. Ganhar de mais até, já que teve um gol injustamente anulado e perdeu outras chances incríveis.
E para terminar - neguinho gosta mesmo é de reclamar da Seleção: foi perder para dizer que time deveria ter recuado. Só que antes da Copa, todo mundo reclamava: "Bota ponta, Telê!", porque ele jogava com quatro no meio de campo. Ou seja, queriam que o time atacasse.
Depois desta derrota, criou-se a certeza do futebol de resultados, o "importante é ganhar, não importa se jogue feio ou não". Vieram os volantes brucutus, veio Parreira e veio o tetracampeonato. Jogando feio, muito feio. Que pena.
E os dois em cima do mesmo adversário, o São Paulo. Em 82, o Corinthians havia sido campeão do primeiro turno, já se classificando para a final. No segundo turno, disputou o primeiro lugar (que daria a segunda vaga) com o São Paulo, que acabou vencendo.
Então, foram mais dois jogos para decidir o vencedor. Em dois jogos, com mais duas vitórias corinthianas. Na última partida, o gol inesquecível: Ataliba, que era gago, gaguejou no meio de dois zagueiros são-paulinos, que se trombaram e caíram como pinos de boliche. Mais um outro drible e lá estava Casão, livre pra fazer o gol.
Em 1983, a Democracia Corinthiana continuava embalada - mais outro título paulista. Desta vez, sem o mesmo brilho do ano anterior, afinal o último jogo foi um empate em 1 a 1, com o Leão salvando a pátria quando ninguém mais estava pensando no jogo e só comemorava.